quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Sentar-se à janela

SENTAR-SE À JANELA
Alexandre Garcia
Era criança quando, pela primeira vez, entrei em um avião. A ansiedade
de voar era enorme. Eu queria me sentar ao lado da janela de qualquer
jeito, acompanhar o vôo desde o primeiro momento e sentir o avião
correndo na pista cada vez mais rápido até a decolagem.
Ao olhar pela janela via, sem palavras, o avião rompendo as nuvens,
chegando ao céu azul. Tudo era novidade e fantasia. Cresci, me formei,
e comecei a trabalhar. No meu trabalho, desde o início, voar era uma
necessidade constante.
As reuniões em outras cidades e a correria me obrigavam, às vezes, a
estar em dois lugares num mesmo dia. No início pedia sempre poltronas
ao lado da janela, e, ainda com olhos de menino, fitava as nuvens,
curtia a viagem, e nem me incomodava de esperar um pouco mais para
sair do avião, pegar a bagagem, coisa e tal. O tempo foi passando, a
correria aumentando, e já não fazia questão de me sentar à janela, nem
mesmo de ver as nuvens, o sol, as cidades abaixo, o mar ou qualquer
paisagem que fosse. Perdi o encanto. Pensava somente em chegar e sair,
me acomodar rápido e sair rápido.
As poltronas do corredor agora eram exigência . Mais fáceis para sair
sem ter que esperar ninguém, sempre e sempre preocupado com a hora,
com o compromisso, com tudo, menos com a viagem, com a paisagem,
comigo mesmo.
Por um desses maravilhosos 'acasos' do destino, estava eu louco para
voltar de São Paulo numa tarde chuvosa, precisando chegar em Curitiba
o mais rápido possível.
O vôo estava lotado e o único lugar disponível era uma janela, na
última poltrona. Sem pensar concordei de imediato, peguei meu bilhete
e fui para o embarque.
Embarquei no avião, me acomodei na poltrona indicada: a janela. Janela
que há muito eu não via, ou melhor, pela qual já não me preocupava em
olhar.
E, num rompante, assim que o avião decolou, lembrei-me da primeira vez
que voara. Senti novamente e estranhamente aquela ansiedade, aquele
frio na barriga. Olhava o avião rompendo as nuvens escuras até que,
tendo passado pela chuva, apareceu o céu.
Era de um azul tão lindo como jamais tinha visto. E também o sol, que
brilhava como se tivesse acabado de nascer.
Naquele instante, em que voltei a ser criança, percebi que estava
deixando de viver um pouco a cada viagem em que desprezava aquela
vista.
Pensei comigo mesmo: será que em relação às outras coisas da minha
vida eu também não havia deixado de me sentar à janela, como, por
exemplo, olhar pela janela das minhas amizades, do meu casamento, do
meu trabalho e convívio pessoal? Creio que aos poucos, e mesmo sem
perceber, deixamos de olhar pela janela da nossa vida.
A vida também é uma viagem e se não nos sentarmos à janela, perdemos
o que há de melhor: as paisagens, que são nossos amores, alegrias,
tristezas, enfim, tudo o que nos mantém vivos.
Se viajarmos somente na poltrona do corredor, com pressa de chegar,
sabe-se lá aonde, perderemos a oportunidade de apreciar as belezas que
a viagem nos oferece.
Se você também está num ritmo acelerado, pedindo sempre poltronas do
corredor, para embarcar e desembarcar rápido e 'ganhar tempo', pare um
pouco e reflita sobre aonde você quer chegar.
A aeronave da nossa existência voa célere e a duração da viagem não é
anunciada pelo comandante. Não sabemos quanto tempo ainda nos resta.
Por essa razão, vale a pena sentar próximo da janela para não perder
nenhum detalhe.
Afinal, 'a vida, a felicidade e a paz são caminhos e não destinos'.

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